sábado, 28 de maio de 2011

Entrevistado do mês_Dr.Geógrafo Marcos Saquet

Gaúcho de Silveira Martins começou sua formação em nível superior na UNIJUÍ, entre 1986 e 1990, cursando a licenciatura em Geografia. Depois, entre 1991 e 1992, fez o curso de Especialização em Geografia Ambiental, na UFRGS, onde iniciou sua carreira no ensino superior como docente. Na época, fui professor colaborador, com 20 horas semanais de trabalho. Percebeu que se identificava com o ensino superior e se preparou para fazer o curso de mestrado. Fez a seleção na UFSC, no final de 1992 e iniciou o curso de mestrado em Geografia em 1993, concluindo-o em fevereiro de 1996. É interessante evidenciar que, no TCC da licenciatura, trabalhou com a problemática da fronteira; na monografia do curso de especialização, com a expansão urbana em Porto Alegre e a questão ambiental e, na dissertação de mestrado, trabalhou com os temas imigração italiana e cooperativismo, ou seja, embora tenha se dedicado aos estudos da chamada geografia humana, mudou significativamente os (temas) estudados. No doutoramento, de maneira mais centrada, estudou o processo de desterritorialização e reterritorialização dos italianos no Rio Grande do Sul, mais especificamente, na Colônia Silveira Martins, localizada nas proximidades de Santa Maria (atualmente denominada de Quarta Colônia). Fez o doutorado em Geografia na UNESP, Campus de Presidente Prudente (SP), entre 1998 e 2001, e realizou o doutorado sanduíche na Universidade Ca’Foscari, de Veneza, em 2000, justamente para aprofundar as pesquisas sobre a emigração italiana para o Brasil no final do século XIX. Como se pode notar com facilidade, ele teve toda formação superior centrada na Geografia, o que também aconteceu no pós-doutoramento que realizou no Politécnico e Universidade de Turim, em 2006, oportunidade em que decidiu dedicar ao estudo das concepções do conceito de território, cujo principal resultado foi a publicação do livro “Abordagens e concepções de território”, pela Editora Expressão Popular, em 2007.

Bom, o nosso entrevistado de hoje e representando todos os Geógrafos, já que o dia do Geógrafo é amanhã, e também é um dos citados em meus trabalhos acadêmicos e certamente estará como uma das minhas referências no meu TCC, Marcos Aurélio Saquet. Depois de ler a entrevista deixe seus comentários e/ou deixe seu recado para o seu Geógrafo preferido ou de inspiração em seus trabalhos.



PPEG- “O território se dá quando se manifesta e se exerce qualquer tipo de poder, de relações sociais. São as relações que dão o concreto ao abstrato, são as relações que consubstanciam o poder. Toda relação social, econômica, política e cultural é marcada pelo poder, porque são relações que os homens mantêm entre si nos diferentes conflitos diários.” (2003,p.24) Com Copa do Mundo, Olimpíadas, novo Código Florestal, realitys shows...., numa visão geográfica, na sua opinião, qual será o rumo do Brasil entre Território e o Ambiente?

Marcos Saquet – Puxa vida, eis uma grande questão. Tanto a copa do mundo, como as olimpíadas e o novo código florestal envolvem profundas e intensas relações de poder e, evidentemente, muitos interesses econômicos, políticos, culturais e ambientais. Relações e interesses que definem, continuadamente, novos significados aos territórios e, ao mesmo tempo, aos ambientes contidos neles. Isso ocorre porque o território é efetivado tanto por processos sociais como naturais, ou seja, pelo poder, pelas identidades, pelas redes de circulação e comunicação e pela natureza exterior ao homem. Dito de outra maneira, pela processualidade histórica e relacional concretizada todos os dias nas relações sociedade-natureza. Os fatores, os elementos e os processos são múltiplos e historicamente definidos. Isso se objetiva e subjetiva ao mesmo tempo, nas formas e nos conteúdos de cada território, portanto, também nos processos de desterritorialização e reterritorialização envolvidos na organização da copa do mundo, das olimpíadas, nas discussões e na implantação do novo código florestal, e assim por diante. Parece-me que já conhecemos os efeitos desses processos: aumento das desigualdades sociais, da concentração da riqueza, da degradação ambiental, investimentos consideráveis por parte do Estado favorecendo grandes empresas privadas, exclusão social, enfim, processos imanentes à expansão do capital e à sua reprodução ampliada a partir, como afirmaram já na década de 1970 dois autores italianos, Francesco Indovina e Donatella Calabi, do uso e da apropriação capitalista do território. Talvez eu esteja sendo um pouco (ou muito!) pessimista com os “rumos” do Brasil, porém, não percebo iniciativas significativas que possam substantivar o rompimento com o movimento do capital. Precisamos aprender, consoante afirmara recentemente Massimo Quaini, a lutar contra o gigantismo chinês, contra grandes iniciativas que reforçam a concentração do capital e a centralização do poder, construindo iniciativas coletivas em favor da proteção do ambiente, da valorização das minorias e das identidades culturais, do saber popular, da produção familiar agroecológica de alimentos, enfim, a favor de planos e projetos de desenvolvimento territorial com mais justiça social, da recuperação e proteção ambiental, da distribuição de renda e terra, de fortes investimentos públicos na saúde, na educação, no saneamento básico, na segurança etc., contrapondo-se à reprodução ampliada do capital.

PPEG- Estarás participando do XXX EEG (Encontro Estadual de Geografia), no dia 4 de junho, da mesa redonda “Entre Território e Ambiente” conjuntamente com os Geógrafos Maurício Meurer e Fábio Sanches. Para deixar os nossos visitantes curiosos, como será a sua participação nesse debate.

Marcos Saquet - Pretendo ilustrar e problematizar justamente essa problemática que mencionei anteriormente, a partir de uma concepção de Geografia histórico-crítica, relacional, multidimensional, reticular e com um caráter político bem definido, ou seja, de denúncia, interpretação e representação subsidiando diretamente a construção democrática de projetos de desenvolvimento territorial orientados em pequenas iniciativas, participativas e sem impactos ambientais significativos. É necessário qualificar ainda mais nossas pesquisas, relacionando-as diretamente com os ambientes e com os sujeitos estudados. Estes últimos precisam participar de nossos estudos e receber os resultados a ponto de poder utilizá-los para se conhecer e definir os planos e projetos. Isso somente pode acontecer se formos efetivamente pesquisadores e sujeitos do desenvolvimento, ou seja, se atuarmos diretamente na discussão e elaboração de planos e projetos alternativos de desenvolvimento, conforme comentei anteriormente, valorizando as identidades culturais, os grupos sociais minoritários, recuperando ambientes degradados, construindo experiências solidárias e cooperativas etc. Temos, na Geografia e na Sociologia, por exemplo, um acúmulo expressivo de conhecimento sobre as concepções de território, territorialidade, desenvolvimento, autonomia, gestão e participação que precisam ser utilizados qualificadamente nas políticas públicas, por exemplo, para orientar e financiar projetos que estejam centrados, de fato, na valorização das pessoas, dos lugares e dos ambientes. Não podemos centrar os investimentos em grandes unidades fabris, onde há pouquíssimos donos e muitos trabalhadores subordinados! É necessário investir na qualidade de vida do povo brasileiro e isso requer necessariamente a preservação do ambiente!


PPEG - Para finalizar, qual a prática pedagógica que poderia sugerir aos nossos visitantes que estão estagiando em escolas?

Marcos Saquet - Considerando a perspectiva metodológica que trabalho, ou seja, tento sempre realizar atividades de ensino, pesquisa e extensão, é fundamental que sejamos professores-pesquisadores e sujeitos atuantes nas localidades onde exercemos a prática pedagógica. O professor precisa, necessariamente, estar sempre atualizado, lendo, comprando livros, participando de eventos, pesquisando e interagindo com os estudantes e com os demais membros da sociedade local. Sei que é difícil diante dos baixos salários e das condições precárias que normalmente temos para trabalhar, porém, sempre acreditei que é necessário fazer um pouco mais, dedicar-se além do que nos é solicitado, “vestir a camisa” da escola, da educação e da transformação social. Sem nosso esforço e sem nossa dedicação cotidiana, para além da banalidade e das rotinas, não haverá transformação em favor de uma sociedade mais justa e de uma vida mais qualificada. Isso requer, também, como já mencionei, fortes investimentos por parte do Estado em favor das causas dos grupos oprimidos, daqueles que não têm terra, não têm teto, não tem assistência médica e dentária etc. É necessário, na atual conjuntura, na minha opinião, criar novos espaços políticos e novas formas de organização, o que passa evidentemente pela escola e pela educação, rompendo efetivamente com os vícios e as amarras existentes por meio da atual organização político-administrativa do Brasil. É necessário, portanto, uma reforma política séria e democrática em favor da autonomia e da autogestão! Por isso, é fundamental termos clareza da Geografia que queremos fazer e para quem trabalhamos! Temos que trabalhar, dentro e fora da escola, para o povo, para os grupos minoritários que, de fato, precisam do conhecimento que produzidos e de nossa orientação política. Esse é um “passo” muito importante para construirmos novos valores políticos, culturais, ambientais e econômicos, protegendo e valorizando o ambiente, as pessoas e os lugares-territórios onde vivemos todos os dias.

Nenhum comentário:

Postar um comentário